domingo, 7 de outubro de 2018

MAS EU TE DISSE, EU TE DISSE.... IV



Publicado originalmente em 19 de março de 2016 14:19

SOBRE A NEUTRALIDADE

(respondendo a alguns questionamentos)

Vejo muita gente dizendo-se “neutro”. “Os dois lados estão errados”. E outras lenga-lengas. Na vida prática, na ação de sujeitos humanos concretos, é muito difícil encontrar o “bem” em estado puro. E é muito fácil, também, ficar de braços cruzados esperando que este “bem” caia do céu.
Na maioria das situações, não há apenas duas posições a se analisar, a complexidade impõe diversos pontos de vista que levam à ponderação.
Há momentos, inclusive, em que se pode se abster de tomar um posicionamento. Esta abstenção pode revelar uma dúvida, ou mesmo um terceiro posicionamento que não esteja explicitado.
No entanto, há outros momentos da vida pessoal ou coletiva em que se tem que fazer uma opção. Há algumas situações em que não há como ter dúvida.
No atual momento, por exemplo, um dos lados defende o uso da força e da violência para resolver os problemas, defende uma ditadura militar que, depois de 20 anos de poder autoritário nas mãos (não se trata de um governo democrático que tem que negociar para implementar suas agendas, ao contrário eles tiveram caminho livre para fazer o que queriam) entregou um país, na década de 1980, com hiperinflação, corrupção, crime organizado, Estado aparelhado, violência, tráfico de drogas, uma dívida externa considerada impagável, uma mídia monopolizada, centenas de pessoas torturadas e mortas, e um abismo social gigantesco entre uma minoria detentora de bens e capital e uma imensa maioria pobre, sendo uma boa parte desta em situação de indigência.
Além disto, este lado comete crimes claros, utilizando todo o subterfúgio possível, sem receber qualquer tipo de punição. Utiliza-se do poder judiciário de maneira, evidentemente, parcial. Utiliza-se da imprensa, cuja função, exercida sob concessão pública, seria a de informar, para difamar e achincalhar, cotidianamente, personagens e projetos políticos que expressam o pensamento de grande parte dos brasileiros.
Neste lado, que alguns dizem que é simétrico ao outro, há pessoas que defendem a homofobia, o racismo, o machismo, a mídia monopolista, a privatização, o desmonte do Estado.
Há pessoas que xingam, de maneira vil e repugnante, uma senhora que é presidente da República, seja em passeatas ou em eventos internacionais.
São estas pessoas os baluartes da moralidade?
Neste lado, há pessoas, inclusive, que estão utilizando de violência contra qualquer um que represente algum tom de discordância. Estão atacando e destruindo sedes de partidos e sindicatos.
Claro, isto tudo incentivado, abertamente, por uma mídia covarde, com discurso partidário, unilateral e deformado.
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Sim, há erros em ambos os lados.
O lado que eu defendo tem uma responsabilidade grande na atual crise, especialmente por ter apostado apenas no aumento do consumo e não ter insistido na implementação de reformas estruturais que possibilitassem bases ético-morais mais sólidas para a construção do país, a redução das desigualdades e o aperfeiçoamento da democracia.
Sim, para o bem do país, deveríamos conversar, os dois blocos (estes blocos, depois, se fragmentarão), reconhecer alguns erros e tentar achar uma maneira de conduzir o país ao equilíbrio e à sensatez.
Mas a simetria que você alega não existe, especialmente quando se refere a valores.
Ao tomar uma posição em defesa da democracia neste momento, contra um golpe autoritário explicitamente arquitetado, você não está endossando todos os erros cometidos por este ou aquele partido, apenas, num momento crucial, está, de fato, mostrando quais sãos os seus valores mais profundos.
O sistema democrático atual é ainda muito imperfeito. Temos que lutar por melhorá-lo.
Mas o que está em jogo agora é a soberania popular e a defesa de alguma ordem democrática que garanta o seu, o nosso direito, de votar, escolher o que queremos, de termos direito de defesa quando acusados. De termos direito à nossa privacidade. De termos direito a informações, sem tanta distorção, por meio de meios comunicação mais honestos e democráticos que os atuais.
Você até pode ficar com sua reputação “’aparentemente intacta” com a declaração de “neutralidade”. Sem ‘sujar as mãos’, tomando uma posição. Mas no fundo da consciência você sabe que o que você chama de neutralidade é apenas um profundo medo. E sabe que a sua “imparcialidade”, em verdade, reforça um dos lados que está, neste momento, em posição de ataque. Dizer que é tudo a mesma coisa, que são todos iguais, que todo mundo rouba é justificar o descumprimento das leis e só piora a situação em que nos encontramos.

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